Por José Henrique Cavalcanti Lima e Patrícia Cristina Matos
Um dos principais requisitos para a obtenção da osseointegração é a estabilidade inicial que atingimos no momento da instalação dos implantes. Esta estabilidade inicial (estabilidade primária mecânica) permite que as diversas fases envolvidas no processo de osseointegração ocorram adequadamente desde a primeira interface formada entre o coágulo e a superfície do implante.
A ausência de micro movimentos é fundamental para a obtenção dos fenômenos subsequentes, tais como: após o coágulo, a migração dos vasos para o tecido de granulação; a chegada de células mesenquimais indiferenciadas que estimuladas por fatores de crescimento induzem as células mesenquimais em células pré-osteoblásticas e osteoblastos, formando assim a matriz óssea e atingindo a estabilidade secundária biológica e, consequentemente, a osseointegração.
Após entrar em função, o implante continua e mantém uma atividade moduladora da interface osso/implante de acordo com a força exercida sobre a prótese (estabilidade terciária).
Durante a fase cirúrgica para a instalação dos implantes, os motores que utilizamos para a realização desses procedimentos, com maior ou menor precisão, fornecem uma medida de força mecânica (torque), que permite a aferição da estabilidade mecânica primária. Alguns motores permitem medir tanto o torque utilizado sobre as brocas para o preparo do leito cirúrgico (osteotomia), como o torque de instalação, dando total controle da força empregada na broca e na inserção do implante, além da velocidade aplicada, como podemos ver nos gráficos A e B.
Gráfico A: Velocidade e torque durante o preparo do leito cirúrgico.
Gráfico B: Velocidade e torque empregados para instalar um implante Maestro 3.5 X 11 mm na região de primeiro pré-molar superior esquerdo.
Porém, após a instalação do implante, não tínhamos como acompanhar e medir o aumento do contato entre osso e implante (BIC) durante as diferentes fases da cicatrização e remodelamento ósseo. A única forma de obtermos essa medida de BIC é através de cortes histológicos, como demonstrado na figura 2.
Anteriormente ao desenvolvimento de ferramentas para medir a estabilidade dos implantes, tais como o Osstell, os implantes recebiam unicamente um acompanhamento de forma clínica por avaliações mecânicas e sensoriais feitas pelo profissional. Também as aplicações de torques relativos durante a execução da etapa protética, de acordo com as instruções do fabricante do sistema utilizado, que podem variar entre 10 a 35 Ncm, dependendo do pilar utilizado, serviam de informação sobre a qualidade da osseointegração obtida até esse momento.
Entretanto, no final da década de 1990, tivemos as primeiras publicações de artigos liderados por Lars Sennerby e Neil Meredith apresentando um instrumento de medição da estabilidade nas diversas fases da osseointegração. Lennart e Anders Petterson, engenheiros elétricos, foram responsáveis pela criação e desenvolvimento do aparelho Osstell, que atualmente está na sua quinta versão.
Este aparelho utiliza uma medida para indicar a estabilidade: o ISQ – Quociente de Estabilidade do Implante. Com este equipamento, pode-se ter o acompanhamento da evolução da estabilidade mecânica primária para a estabilidade biológica secundária, inclusive para confirmar o seu carregamento antecipado. O valor ISQ objetivo e numérico é obtido através da irradiação eletromagnética de um SmartPeg, uma peça de alumínio com um imã na ponta, que é aparafusado no hexágono/conexão externa ou hexágono/conexão interna do implante, dependendo do tipo de conexão do implante em questão, conforme figuras 3, 4, 5 e 6.
Estas mensurações ISQ são variáveis de 1 a 100 através da tecnologia da varredura por frequência de ressonância (RFA) da superfície do implante em contato com o osso. O RFA mede a estabilidade lateral completa do implante. Após muitos estudos clínicos, foi concluído dentro dos parâmetros para o ISQ que: de 1 a 25, o implante pode ser perdido, pois esse índice de estabilidade pode permitir micro movimentações que influenciam na interface osso/implante; de 25 a 60 os implantes permaneceram sepultos (sem carga); após 60 até 70 podemos carregar os implantes em casos múltiplos com critérios, mesmo em carga imediata; acima de 70 até 100 poderemos carregar os implantes mediatos ou imediatos com carga imediata. Portanto, devemos ter valores acima de ISQ 60 para começar a planejar a carga no implante. Se for uma prótese total esplintada, valores acima de ISQ 60 permitem a carga imediata ou carregamento mediato. Para próteses com múltiplos implantes, devemos ter valores ISQ acima de 65, e para implantes com próteses unitárias, precisamos de um valor ISQ acima de 70, conforme figuras 6 e 7.
Devemos também ressaltar, que não existe correlação entre as medidas torque de inserção e ISQ. São medidas distintas com aferições totalmente diferentes, não havendo até o momento nenhum estudo que possa correlacionar.
O Osstell é utilizado na avaliação clínica durante o processo de osseointegração, nos permitindo acompanhar clinicamente com precisão o índice de estabilidade aumentando ou diminuindo, medido pela unidade ISQ. O acompanhamento dos valores ISQ permite criar a curva da osseointegração.
A utilização clínica do Osstell traz grandes benefícios, pois podemos aferir a estabilidade do implante em diferentes fases de cicatrização óssea. Revisões clínicas após a reabilitação permitem avaliar com precocidade lesões peri-implantares com comprometimento ósseo, onde pode-se perder contato osso/implante, podendo influenciar na estabilidade e manutenção do implante em função. Podemos também acompanhar o reparo tecidual ósseo após a correção com regeneração óssea guiada de implantes submetidos a tratamentos de peri-implantites.
O Osstell hoje é um aliado fundamental para a avaliação clínica da estabilidade e sucesso em longo prazo dos implantes dentais. Com mais de 1100 referências na literatura mundial e 20 anos de acompanhamentos clínicos de casos no mundo todo, sabemos que este índice para se aferir estabilidades está totalmente consolidado na clínica do dia a dia.
O Quociente de Estabilidade do Implante (ISQ) é um padrão mundial utilizado para medir a estabilidade do implante. Valores mais elevados são geralmente observados na mandíbula do que na maxila devido ao osso normalmente mais denso. Valores de ISQ menores, geralmente são encontrados durante a medição na direção buco-lingual (BL), enquanto na direção mésio-distal (MD), por ter um volume ósseo maior, encontramos geralmente valores de ISQ maiores.
O carregamento progressivo é apoiado por apenas alguns estudos clínicos (Rotter 1996, Appleton 2005, Ghoveizi 2013), mas é aqui que vem a parte interessante, pois a lógica por trás desse conceito faz sentido do ponto de vista clínico e biológico. Alguns implantes no final do período de osseointegração têm menos de 25% da superfície total em contato com o osso circundante (Misch 1993). Embora tenham baixos valores de BIC, são clinicamente estáveis. No entanto, essa estabilidade pode ser perdida a médio ou longo prazo quando o implante é carregado com a restauração definitiva. Estes eventos são comuns na clínica e muitas vezes o dentista fica sem respostas, pois acredita que o implante estava osseointegrado.
Os problemas são mais prováveis de ocorrer se a densidade óssea ao redor do implante for baixa, principalmente na maxila posterior (Norton 2001), embora possa haver densidade óssea diferente em várias regiões da mandíbula e da maxila (Parker 2008 , Fuh 2010). Como melhorar a densidade óssea ao redor dos implantes durante o período de cicatrização? No momento, não existe nenhum método clinicamente validado e previsível para aumentar a densidade óssea ao redor de um implante, a não ser a técnica de osseodensificação durante a realização do leito cirúrgico.
Em relação à “teoria mecanostática” de Frost, o aumento da densidade óssea é o resultado de uma relação dinâmica entre carga e resposta de modelagem óssea positiva (Frost 1983, Frost 1987). Portanto, a carga exercida sobre o implante é responsável pelo constante modelamento e manutenção da osseointegração na interface osso/implante.
Como utilizar o Osstell
O Osstell irá auxiliar o profissional na tomada de decisão para realizar uma carga imediata, precoce ou tardia no implante.
Sempre realizar a medição logo após a instalação do implante. Para isso, selecionar o correto SmartPeg para o tipo de implante utilizado. Com o montador do SmartPeg (Figura 5), aparafusar o SmartPeg com força manual (4-6 Ncm) no implante. Colocar um protetor de biossegurança no Osstell Beacon. Posicionar a ponta do Osstell próxima da ponta do SmartPeg e realizar de forma automática a obtenção do valor ISQ na direção BL, e após, na direção MD.
Após a mensuração logo após a instalação do implante, avaliar os valores de ISQ encontrados e decidir a carga de acordo com as recomendações da literatura (ver Figura 7).
No caso de uma carga tardia, realizar nova medição após a reabertura do implante. Para confirmar a osseointegração biológica do implante, o valor ISQ deve estar maior na reabertura do que no dia da instalação do implante. Esta curva ascendente dos valores do ISQ atesta a estabilidade biológica secundária. Se o valor for menor do que no dia da instalação do implante, é um sinal de que algo não está correndo biologicamente bem, devendo se reavaliar toda a situação do implante.
Na Implacil De Bortoli, para o implante hexágono externo 3.3/3.5 é indicado o SmartPeg modelo 26; para implantes hexágono externo 3.75, 4.0, 4.75 e 5.0, é indicado o SmartPeg modelo 14.
Para implantes hexágono interno 3.3 e 3.5, é indicado o SmartPeg modelo 26, e para diâmetros 3.75, 4.0, 4.3, é indicado o SmartPeg 14.
Para implantes Cone Morse Maestro e Due Cone, o SmartPeg indicado é o modelo 16. Para os componentes protéticos Mini Cônicos retos, o SmartPeg indicado é o modelo 25.
Conclusão
Após muitos estudos cientificamente conduzidos e avaliada a atividade histológica em diferentes etapas do remodelamento ósseo/implante, temos a necessidade de conduzir junto à clínica e reproduzir clinicamente a esta atividade o que conseguimos com as medições realizados pelo Osstell através do SmartPeg com o ISQ.Isto nos dá uma visão mais clínica e longitudinal da obtenção e manutenção da osseointegração e, consequentemente, o sucesso da reabilitação com implantes dentais.
REFERÊNCIAS
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