Fluxo de trabalho digital para fabricação de uma overdenture usando uma guia cirúrgica de implante e um scanner intraoral

Matéria da semana 26-02-2024 - Ulisses Dayube

Fluxo de trabalho digital para fabricação de uma overdenture usando uma guia cirúrgica de implante e um scanner intraoral

Por Ulisses Dayube

As próteses totais inferiores, muitas vezes, carecem de retenção e estabilidade, o que pode comprometer a satisfação e o conforto do paciente.1 Em 1987, Van Steenberghe et al2 propuseram o uso de uma overdenture suportada por dois implantes. Estudos relataram que a taxa de sucesso de overdentures suportadas por implantes foi de até 96%.3-6  Overdentures suportadas por dois implantes podem aumentar significativamente a função e a satisfação durante o primeiro ano, e essas overdentures podem durar de cinco a dez anos.6  De acordo com a declaração de consenso de McGill e York, uma overdenture mandibular suportada por dois implantes deve ser o tratamento de primeira escolha para pacientes edêntulos.7, 8

O processo de fabricação de uma overdenture é semelhante ao de uma prótese total convencional e envolve uma série de operações manuais, incluindo fazer uma moldagem, fabricar moldeiras individuais e determinar a dimensão vertical oclusal entre outros.

Esses processos apresentam alto risco de erros operacionais.9  Nos últimos anos, os dentistas começaram a pesquisar e fabricar próteses totais digitais com resultados positivos.10, 11  Porém, como técnica modificada para próteses totais, poucos estudos avaliaram o uso de técnicas digitais na confecção de overdentures.

Para obter sucesso a longo prazo com overdentures, os dois implantes devem estar paralelos no eixo de inserção da overdenture e perpendiculares ao plano oclusal.12  Porém pode ser difícil cumprir estes requisitos sem utilizar uma guia cirúrgica para a colocação do implante. Embora os modelos de implantes auxiliados por computador tenham sido amplamente utilizados na reabilitação de maxilares completamente edêntulos com próteses fixas, eles raramente são usados para implantes em overdentures.13

O objetivo deste artigo é apresentar um fluxo de trabalho digital para a fabricação de overdentures usando como referência as próteses existentes.

Técnica

Comece o planejamento da overdenture avaliando as próteses totais do paciente (Figura 1). Se estiverem boas tanto na estética como na função, podem ser utilizadas como referência para o planejamento. Se o paciente não tem próteses totais, faça as próteses totais provisórias com a estética e função adequadas, e com a dimensão vertical de oclusão correta. Então realize tomografia computadorizada de feixe cônico pela técnica do duplo escaneamento tomográfico.

Figura 1 – Próteses totais do paciente.

Marcações na prótese

Devemos realizar de seis a sete marcações de guta percha (Figura 2) de cerca de 2 mm na flange da prótese (as marcações devem estar presentes nas partes anterior e posterior da prótese).

Figura 2 – Marcações de guta percha na flange da prótese.

Tomografia 1 (paciente com prótese)

O protocolo para aquisição das tomografias consiste numa técnica de escaneamento duplo. Primeiramente, é realizada a tomografia computadorizada do paciente com a prótese total ou guia tomográfico com as marcações. O paciente precisa estar com um afastador labial (Figura 3) para afastar a mucosa da prótese.

Figura 3 – Afastador labial.

Os parâmetros de aquisição devem ser de no máximo 0,5 mm de espessura de corte, com “FOV” suficiente para a visualização do osso alveolar, estruturas nobres adjacentes e dentes. Para o escaneamento da prótese total ou guia tomográfico, deve-se reduzir a espessura do corte para 0,2 mm. Não se deve utilizar prótese total ou guia tomográfico que contenha metal, pois geram artefato de imagem e perda de qualidade da guia cirúrgica.

Tomografia 2 (tomografia da prótese)

Tomografia somente da prótese total, lembrando-se de usar algum anteparo de baixa densidade para separar a prótese da mesa do tomógrafo (Figura 4).

Figura 4 – Tomografia somente da prótese total, que está apoiada num bloco de isopor.

Os resultados desses exames (arquivos com extensão DICOM – Digital Imaging and Communications in Medicine) devem ser enviados ao centro de planejamento e impressão de guias por meio digital. Importe os dados para o software de planejamento de implantes (Exoplan, Exocad) para planejar o melhor posicionamento dos implantes (Figura 5) e projetar uma guia cirúrgica prototipada. Após o desenho da guia, faz-se a exportação do arquivo .stl e a impressão da guia pode ser realizada. De posse da guia impressa e após a colocação das anilhas referentes aos implantes planejados (Figura 6), realize a cirurgia de implante sem retalho guiada por computador sob anestesia local.

Figura 5 – Planejamento dos implantes no Exoplan.
Figura 6 – Guia impressa com as anilhas referentes aos implantes de 3.5.

Faça a fresagem dos implantes conforme o fabricante e insira os dois implantes (implantes Maestro, Implacil De Bortoli) no rebordo alveolar usando a guia cirúrgica prototipada (Figura 7).

Figura 7 – Instalação dos implantes Maestro.

Após a cirurgia, coloque os tapa implantes nos implantes. Verifique a base da prótese e ajuste de forma que não entre em contato com os tapa implantes (Figura 8). Se julgar necessário, injete material de reembasamento macio (COE-SOFT; GC Corp) na base da prótese e faça o reembasamento usando a técnica da boca fechada.

Figura 8 – Cirurgia finalizada (RX periapical mostrando o paralelismo dos implantes com os tapa implantes em posição).

Dois meses após a cirurgia, instale os componentes o’ring nos implantes (Figura 9). E faça a captura das cápsulas na prótese provisória a fim de que o paciente já se acostume com a prótese total mucossuportada implantorretida (Figura 10).

Figura 9 – Componentes O’ring em posição.
Figura 10 – Captura das cápsulas dos O’rings na prótese total provisória.

Após a adaptação do paciente com a prótese implantorretida, fazemos a confecção da overdenture definitiva pelo fluxo digital. Começamos por um reembasamento das bases das próteses provisórias com silicone de adição light e regular. Usamos o silicone de adição light no centro da base das próteses totais e o silicone regular na borda das próteses totais provisórias para conseguirmos afastar melhor os tecidos do fundo de vestíbulo (Figura 11).

Figura 11 – Técnica de moldagem com silicone light e regular.

Feitas as moldagens, realizamos o escaneamento 360o das próteses, oclusão e escaneamento dos lábios (Figura 12). Então, enviamos os arquivos ao laboratório de prótese para confecção das próteses totais digitais (Figura 13). Após aprovado os desenhos, recebemos as próteses totais impressas e maquiadas para fazer a captura das cápsulas dos O’rings.

Figura 12 – Escaneamento 360o das próteses, oclusão e escaneamento dos lábios.
Figura 13 – Desenho, impressão e próteses totais impressas e maquiadas.

Com as próteses totais em mãos, fazemos a captura das cápsulas metálicas na prótese total inferior definitiva. Utilizamos o kit O’ring que na embalagem vem com as seguintes peças: componente O’ring, cápsula metálica padrão (com borracha), anel plástico, cápsula plástica (leia o QR Code na Figura 14 sobre como utilizar os componentes). Primeiro coloque os anéis plásticos espaçadores nos O’rings antes das cápsulas metálicas com borracha (Figura 15). O anel de plástico é usado para dar a posição adequada da cápsula metálica em relação ao componente O’ring, conferindo o espaçamento necessário para a cápsula trabalhar sem interferência inadequada do O’ring. Avalie bem o assentamento da prótese no rebordo, para verificar se as cápsulas metálicas não estão em contato com as perfurações na base da prótese.

Figura 14 – Kit O’ring: cápsula plástica, componente O’ring, anel plástico, cápsula metálica padrão (com borracha). Leia o QR Code e confira as orientações de uso.
Figura 15 – Anéis plásticos espaçadores nos O’rings embaixo das cápsulas metálicas com borracha.

Use uma resina acrílica para capturar as cápsulas metálicas. Coloque a resina acrílica nas cápsulas metálicas e nas perfurações na base da prótese (Figura 16) e assente a prótese sobre as cápsulas metálicas e o rebordo alveolar. Instrua o paciente a ocluir e manter a posição até a resina polimerizar. Após a polimerização da resina, faça o acabamento e polimento na região das cápsulas (Figura 17) e encaixe a prótese total nos componentes O’ring (Figura 18).

Figura 16 – Resina acrílica nas cápsulas metálicas e nas perfurações na base da prótese.
Figura 17 – Acabamento e polimento na região das cápsulas metálicas.
Figura 18 – Próteses totais finalizadas.

REFERÊNCIAS

1- Van W, Marinus AJ. A influência das variáveis clínicas na satisfação dos pacientes com próteses totais. 63 : 307 -10.

2- Van Steenberghe D, Quirynen M, Calberson L, Demanet M. Uma avaliação prospectiva do destino de 697 acessórios intra-orais consecutivos modum Brane mark na reabilitação do edentulismo. J cabeça pescoço pathol 1987;6:53 -8.

3- Batenburg RH, Meijer HJ, Raghoebar GM, Vissink A. Conceito de tratamento para sobredentaduras mandibulares suportadas por implantes endoósseos : uma revisão da literatura. Implantes Int J Oral Maxillofac 1998;13:539 -45.

4- Jemt T, Chai J, Harnett J, Heath MR, Hutton JE, Johns RB, et al. Um relatório prospectivo de acompanhamento multicêntrico de 5 anos sobre overdentures suportadas por implantes osseointegrados . Implantes Oral Maxillofac Int J 1996;11:291-8.

5- Naert IE, Gizani S, Vuylsteke M, van Steenberghe D. Um ensaio clínico prospectivo randomizado de 5 anos sobre a influência de implantes orais ferulizados e não ferulizados na retenção de uma sobredentadura mandibular: aspectos protéticos e satisfação do paciente. J Reabilitação Oral 1999;26:195 -202.

6- Meijer HJ, Raghoebar GM, Batenburg RH, Visser A, Vissink A. Overdentures mandibulares suportadas por dois ou quatro implantes endósseos : um ensaio clínico de 10 anos . Clin Oral Implants Res 2009;20:722 -8.

7- Feine JS, Carlsson GE, Awad MA, Chehade A, Duncan WJ, Gizani S, et al. A declaração de consenso da McGill sobre overdentures. Overdentures mandibulares de dois implantes como padrão de tratamento de primeira escolha para pacientes edêntulos. Gerodontologia 2002;19:3 -4.

8- Thomason JM, Feine J, Exley C, Moynihan P, Müller F, Naert I, et al. Sobredentaduras mandibulares suportadas por dois implantes como o padrão de tratamento de primeira escolha para pacientes edêntulos – a Declaração do Consenso de York. 207 :185 -6.

9- Rudd RW, Rudd KD. Uma revisão de 243 erros possíveis durante a confecção de uma prótese parcial removível: parte I. J Prosthet Dent 2001;86:251 -61.

10- Kanazawa M, Inokoshi M, Minakuchi S, Ohbayashi N. Teste de um sistema CAD/CAM para fabricação de próteses totais. 30:93 -6.

11- Bonnet G, Batisse C, Bessadet M, Nicolas E, Veyrune JL. Um novo procedimento de prótese digital: uma primeira avaliação dos profissionais . BMC Saúde Bucal 2017;17: 155.

12- Meriscke -Stern R. Forças em implantes que suportam overdentures: um estudo preliminar de considerações morfológicas e cefalométricas. Int J Oral Maxilofac Implantes 1993;8:254 -63.

13- Vercruyssen M, Laleman I, Jacobs R, Quirynen M. Planejamento de implantes apoiados por computador e cirurgia guiada: uma revisão narrativa. Clin Oral Implants Res 2015;26 Supl 11:69-76.

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